segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Augusto Cury e o Evangelho da Autoestima


Recentemente foi lançada no Brasil a Bíblia de estudo do Dr. Augusto Cury pela editora Abba Press. Possuo muitas Bíblias de estudo e no momento estou lendo a Bíblia de Matthew Henry. Sinceramente ainda não decidi se comprarei a Bíblia de Augusto Cury. Posso imaginar pelos seus livros escritos o conteúdo registrado na Bíblia Freemind – Mentes Livres. Nela está inserida 200 páginas de sua tese de dourado para auxílio do leitor. Acredito que a intenção de Augusto Cury é proporcionar ao leitor uma mente livre não pelo conteúdo bíblico em si, mas pelas técnicas da psicanálise defendidas por ele. Muitos não sabem mas Augusto Cury é um ex-ateu e é hoje um autor conhecido e reconhecido mundialmente por seus livros nas áreas da psicologia, psicanálise e educação. É tão lido entre evangélicos que alguns acham até que ele pertence a alguma denominação protestante. Na verdade Augusto Cury é sem religião. Como ele mesmo já disse: “Acho belo as pessoas que tem uma religião, que defendem o que creem com respeito e que são capazes de expor e não impor suas ideias. Quanto a mim, não tenho nem defendo uma religião. Minhas pesquisas sobre Jesus Cristo me levaram a ser um cristão sem fronteiras.”[1] Augusto Cury não esclarece bem o que significa ser um “cristão sem fronteira”, mas ele explica que quando as pessoas queriam saber o rótulo ou a bandeira religiosa de Jesus, o mestre respondia “Eu sou o filho do homem”, frase que Augusto Cury interpreta como um servo da humanidade. Parece então que segundo Augusto Cury para amar e servir as pessoas não se deve estar ligado necessariamente a uma religião. Esse seu conceito e postura facilita a vendagem e circulação de suas obras, pois em sua abordagem psicológica de Jesus dificilmente desagradará a cristãos, judeus ou mesmo os islâmicos. Os primeiros creem na encarnação, divindade, morte, ressurreição e ascensão de Jesus; o segundo grupo acredita na sua existência e crucificação, mas que ele não era o filho de Deus; e os islâmicos acreditam num Jesus profeta que não foi crucificado. E claro, judeus e islâmicos descreem da divindade de Cristo. Em seus escritos Augusto Cury não enfatiza esses aspectos, já que sua interpretação psicológica dos textos bíblicos, constituem mais aplicações individuais equivocadas, fruto de uma exegese tendenciosa e psicanalítica da Bíblia. Em O Mestre da Sensibilidade, por exemplo, após Augusto Cury mencionar a expulsão dos vendilhões do templo, ele conclui que “Precisamos aprender com o mestre de Nazaré a fazer uma “faxina” no templo de nosso interior. Virar a “mesa” dos pensamentos negativos. Extirpar o “comércio” do medo e da insegurança. Reciclar nossa rigidez e rever o superficialismo com que reagimos aos eventos da vida.”[2] Apesar de Augusto Cury falar de “faxina” da alma, jamais fala sobre o novo nascimento. Também não defini o conceito de pecado segundo a Bíblia, pois assim como não explica a limpeza interior segundo Jesus não poderá falar da sujeira do coração segundo a escritura. Para Augusto Cury o problema fundamental do homem não é o pecado e, sim, “a debilidade física do corpo e a incapacidade de gerenciar pensamentos e emoções.”[3] Dessa forma tanto o ensino quanto a pessoa de Cristo não são apresentados nas obras de Augusto Cury conforme o texto canônico. E assim ao invés de um retrato fiel de Cristo e seu ensino o que teremos é a caricatura de um evangelho da autoestima que exalta o homem e não a Deus. A regra de que a escritura interpreta a escritura não é levada em conta por Augusto Cury e, sim, uma interpretação da Bíblia à luz da psicanálise. Num exemplo, ao interpretar João 17.26 ele diz que “A análise psicológica dessas breves palavras tem grandes implicações que se contrapõe a conceitos triviais.”[4] Augusto Cury enfatiza o livre-arbítrio do homem e solapa a soberania de Deus. Apesar de fazer referências a um projeto de Deus, o faz como sendo um sonho divino que a qualquer momento pode ser interrompido pelo homem. Em outras palavras seria um projeto que pode ser frustrado pelo ser humano o que contradiz frontalmente a Bíblia (Jó 42.2). No livro Os Segredos do Pai-Nosso, ele conclui com a terrível frase “Deus e o ser humano são dois seres solitários que vivem no teatro da existência procurando ansiosamente um ao outro no pequeno parêntese do tempo...”[5] Em outro livro, Mestre da Vida, Augusto Cury chega ao ponto de frisar que “Apesar de saber todas as coisas, Deus não intervém na humanidade da forma como gostaríamos e como ele desejaria intervir. Caso contrário, passaria por cima do seus próprios princípios. Transgrediria a liberdade que dá aos seres humanos de seguirem seu destino na pequena bolha do tempo.” [6] Significa que para Augusto Cury existe uma busca ansiosa entre Deus e o homem a fim de ambos se encontrarem e resolverem o problema da solidão e que no final das contas a liberdade humana é quem determina o exercício da soberania divina.
Porém agora com o lançamento da Bíblia Freemind – Mentes Livres, de Augusto Cury, a preocupação tonar-se maior pela influência que exercerá entre os cristãos protestantes e o uso dessa Bíblia nos púlpitos das igrejas. Numa época onde o púlpito evangélico tornou-se um centro irradiador de pregações antropocêntricas centralizadas no ego sob o confuso termo de autoestima, a tendência é o aumento da confusão sobre o amor próprio tão propalado nos dias atuais. O próprio Augusto Cury é o fundador do PAIQ – Programa da Academia de Inteligência de Qualidade de Vida que tem doze capítulos com doze leis de qualidade de vida. Qualquer semelhança com o G12 por causa do número 12 é mera coincidência, se bem que o material pode ser utilizado pelos gedozistas já que não se preocupam com doutrina bíblica. O programa pretende plantar no coração das pessoas “a sementes de “ser autor da própria história”, de “contemplar o belo para expandir o prazer de viver”, de “gerenciar os pensamentos”, da “arte do diálogo”, da “proteção da memória” dentre outras.” [7] O programa enfatiza a mesa redonda do “Eu” para um constante diálogo consigo mesmo, sem referir-se jamais a natureza pecaminosa do homem, a necessidade de nascer de novo e o processo de santificação e consequentemente a formação do fruto do Espírito Santo no homem. Para Augusto Cury os recursos para resolver os problemas interiores do ser humano estão dentro do próprio homem e não fora dele mesmo e por isso nunca precisará clamar por um libertador.
Certa vez o inglês Loyd Jones, médico e depois pregador na Capela de Westminster afirmou que “todo o problema da vida é, em última análise a preocupação com o ego”. [8] Jesus, resumiu toda a lei em dois mandamentos: O primeiro, amar a Deus com todo o entendimento, alma e coração; e o segundo, amar o próximo como a si mesmo. Nos tempos modernos, por influência da psicologia, que orgulhosa e literalmente defini-se como a ciência que estuda a psiquê, ou seja, a alma humana, acrescentou-se um terceiro mandamento: O AMOR A SI PRÓPRIO. Digo orgulhosa porque uma ciência que estuda não o cérebro que é algo físico, mas a mente (alma) que é algo não físico, é certamente prepotente. Imagine você uma ciência estudar o invisível e ainda assim ser considerada ciência, é algo tão incrível que só podemos comparar a uma mágica que deu ao mundo um presente semelhante ao Cavalo de Tróia da antiga Grécia. Porém com seus postulados altamente questionáveis a psicologia diz que só podemos amar alguém se primeiro amarmos a nós mesmos e reconhecermos nosso valor pessoal. O mais terrível é que na época atual caracterizada pelo ódio, violência, desrespeito e autoritarismo o nosso maior problema não é que nos amamos pouco, ao contrário, nos amamos bem demais. Tanto a minha como a sua maior dificuldade não é em amar-se, mas em amar a Deus, nosso criador e amar o próximo, nosso semelhante. Nem eu, nem você e nem ninguém tem problemas de amor próprio, e por isso Jesus disse que deveríamos amar o próximo como a nós mesmos, pois ele partiu do princípio que o amor a si já é latente no ser humano. Não são três mandamentos do tipo: AMOR A DEUS, AMOR AO PRÓXIMO E AMOR A SI PRÓPRIO e, sim, apenas dois: AMOR A DEUS E AO PRÓXIMO, onde o segundo depende do primeiro. Ensinar que o ser humano precisa aprender a amar a si primeiro para depois amar o seu próximo é o mesmo que querer apagar um grande incêndio usando uma mangueira ligada no posto de gasolina. O homem é imagem e semelhança de Deus e tal expressão nos lembra um espelho. O interessante é que um espelho reflete sempre uma imagem que não é sua. Algum problema na imagem refletida não é uma questão de auto-ajuste do espelho, mas sua posição errada com a realidade que reflete. Igualmente nós refletimos uma dignidade que não é nossa, a recebemos na criação e por isso, quando refletimos mal trata-se de erro de relacionamento criatura-Criador e não de auto-imagem. Ora, o erro colossal da psicologia secular da autoestima é este: Ninguém odeia a si mesmo, pois caso fosse verdade as críticas feitas a alguém seriam recebidas com alegria e não com zanga ou tristeza. Na verdade as pessoas odeiam as circunstâncias e situações da vida e não a si mesmas. Mesmo o pior assassino se considera uma pessoa boa e amante de si. Até um suicida, cometeu tal ato por amor próprio, por dominar-se pelo próprio ego e não por falta de amor a si mesmo. 
Como disse o psicólogo David G. Meyers: “As pessoas costumam atribuir a si mesmas os comportamentos positivos e a fatores externos os comportamentos negativos, permitindo-se receber o crédito por suas boas ações e negar a responsabilidade pelas más.”[9] Como prova disso dificilmente você encontra alguém que rejeita o elogio pelo sucesso ou aceita a culpa pelo fracasso. Não, a tendência é o contrário. A egolatria portanto, é o nosso grande problema e não a ausência de amor próprio. Afinal de contas ninguém chega para o seu espelho mágico e diz: “Espelho, espelho meu quem é mais feio do eu”? Chegamos ao nosso espelho e perguntamos quem é mais belo, mais inteligente ou mais bem sucedido. Desde que o mal entrou no gênero humano sempre existiram pessoas egocêntricas e orgulhosas, mas a atual geração se caracteriza por intelectualizar o orgulho sob outros nomes como autoestima, amor próprio, autoimagem, aceitação de si, perdão a si mesmo, complexo de inferioridade e outros. O orgulho tem hoje grande influência da psicologia e de seus psicólogos-sacerdotes como Freud, Jung e Carl Roger. Freud lutou durante parte de sua vida contra a depressão e chegou a usar cocaína por anos a fim de aliviar suas dores psicológicas. [10] Jung falava com espíritos e relata até “viagens” com os mortos e tinha um espírito-guia chamado Filemon [11]. E de Carl Roger, um psicólogo humanista norte-americano que enfatizou a autoestima, temos um exemplo triste do mal que a autoestima pode fazer. Ao responder porque não dera atenção necessária a sua esposa, nos últimos meses de sua doença terminal, ele simplesmente disse “que era necessário para minha sobrevivência que eu vivesse a minha vida, e que isso deveria vir em primeiro lugar, apesar de Helen estar tão doente”. [12] Ainda lembro-me como ficou o rosto da professora de psicologia na faculdade quando citei esse episódio rogeriano, mas uma colega de sala, concordou com a atitude de Roger e acrescentou que cada pessoa deve ser íntegra consigo mesma. Sem querer ela mostrou para a turma que a autoestima é apenas outro sinônimo elegante para orgulho. A filosofia da autoestima produziu e continuará produzindo pessoas assim, orgulhosas de si, íntegras com seu próprio ego e o que é pior, elas terão orgulho de serem orgulhosas. Não é sem propósito que o apóstolo Paulo ao citar as terríveis características do final dos tempos em 2º Timóteo 3, ele começa dizendo que “os homens serão amantes de si mesmos”.

BIBLIOGRAFIA

[1] CURY, Augusto. Nunca desista de seus sonhos. 1ª. ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2004. p 132
[2] CURY, Augusto. O Mestre da Sensibilidade. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. p 84
[3] CURY, Augusto. O Mestre da Vida. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. p 144
[4] CURY, Augusto. O Mestre da Sensibilidade. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. p 79
[5] CURY, Augusto. Os Segredos do Pai-Nosso. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. p 141
[6] CURY, Augusto. O Mestre da Vida. 1ª ed. Rio de Janeiro: Sextante, 2006. p 144
[7] CURY, Augusto. 12 Semanas para mudar uma vida. 1ª ed. São Paulo: Academia, 2007. p 14
[8] HUNT, Dave. Escapando da Sedução. 1ª ed. Porto Alegre: Obra Missionária Chamada da Meia Noite, 1995 p.164
[9] HUNT, Dave. Escapando da Sedução. 1ª ed. Porto Alegre: Obra Missionária Chamada da Meia Noite, 1995 p.169
[10] NICHOLI, Armando M. Deus em Questão C. S. Lewis e Freud. 1ª ed. Minas Gerais: Ultimato, 2005. p 78
[11] HUNT, Dave. Escapando da Sedução. 1ª ed. Porto Alegre: Obra Missionária Chamada da Meia Noite, 1995 p.227
[12] HUNT, Dave. Escapando da Sedução. 1ª ed. Porto Alegre: Obra Missionária Chamada da Meia Noite, 1995 p.165